A ignorância ignorada
Quando soube que Lindemberg Alves Fernandes havia sido condenado a 98 anos de prisão, senti um mal-estar que não soube de onde vinha. Óbvio que se ele tivesse sido absolvido, o mal-estar seria maior, porém 98 anos, num país onde ninguém fica preso por mais de 30, soou como provocação infantil. “Querem o fim de impunidade? Taí! Fartem-se!” A advogada de defesa do assassino disse que apelará da sentença, pois seu cliente merece e deve pagar pelos crimes que cometeu, mas sem servir de bode expiatório.
Meu mal-estar acabou sendo esclarecido através das palavras da ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, em debate ocorrido em Brasília. Rosário alertou para a sexualização precoce e suas consequências, o que de certa forma tem relevância com o fato: Eloá, a vítima, começou a namorar Lindemberg aos 12 anos, numa relação consentida pelos pais.
Adolescentes vivendo experiências adultas é prática comum hoje. Parecem todos preparados para o prazer, mas na hora de enfrentar crises de possessão, rejeições e demais efeitos colaterais do amor, voltam a ser crianças indefesas, sem as ferramentas para refletir e agir de forma sensata. Nesse sentido, Lindemberg poderia abater esses 98 anos com os pais dele, e também com os pais de Eloá, comigo, com você, com todos que fazem parte de uma sociedade que parece não se incomodar com o fato de a ignorância estar ganhando tanto espaço.
Crimes passionais são recorrentes, acontecem com pobres e ricos, moços e velhos. O machismo ainda é praga e precisa ser combatido. Mas o ato insano de Lindemberg não foi provocado apenas por machismo, o que tornam exageradas as manifestações da secretária de Política para a Mulher, Eleonora Menicucci, que ao saber da condenação, declarou: “Que grande emoção, que grande vitória. Essa é uma grande notícia para o Brasil e para as mulheres”.
Prefiro me solidarizar com a reação preocupada e lúcida de Maria do Rosário, que enxerga a questão com mais amplitude: o crime desse rapaz, assim como tiroteios dentro de escolas, turismo sexual envolvendo menores de idade, tráfico de drogas ocorrendo abertamente nas ruas, adolescentes pilotando veículos sem habilitação, tudo isso é uma tragédia anunciada: os jovens estão sem um olhar vigilante. Rosário declarou: “Precisamos não só de governos mais atentos, mas de pais e mães mais atentos, cuidadores mais atentos, sociedade mais atenta”.
O que dói na sentença de 98 anos de Lindemberg é que essa “vitória” é na verdade a revelação do fracasso de todo um sistema familiar que não prioriza o bem-estar mental e físico de cidadãos em formação. Não é culpa dos pais quando os filhos erram, ninguém tem controle e responsabilidade sobre as atitudes dos outros, mas os desatinos proliferam quando há falta de orientação, de apoio, de exemplo, de limite, de estrutura. O resultado desse abandono é que estamos matando e morrendo por estupidez generalizada.
Jornal Zero Hora - 22 fevereiro 2012
.
.
Martha sempre prudente e atenta.
ResponderExcluirObg por compartilhar suas sensatez conosco, Lu!
Um beijo e ah, feliz novo ano! rs'
Oie, como vai?
ResponderExcluirTem um selinho esperando por vc:
http://marianapenna.blogspot.com/2012/02/selo-comemorativo-2-anos-do-blog.html
Bjãooo e bom fds!!