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quinta-feira, 23 de junho de 2016

Martha Medeiros - Jornal Zero Hora - 22 06 16

Recuperando o foco


Em Barra Mansa, RJ, um rio divide um bairro em duas partes, mas em apenas um lado há posto de saúde. Os moradores do outro lado precisavam caminhar dois quilômetros para circundar o rio a fim de chegar ao posto, e por isso vinham solicitando à prefeitura a construção de uma pequena ponte. Ela foi orçada em R$ 270 mil e nunca foi feita, então os moradores reuniram doações e em mutirão construíram a ponte eles mesmos – por R$ 5 mil e em oito dias. Os dois quilômetros de caminhada foram encurtados para 24 metros e agora todos vivem melhor.

Se fosse no Japão, o prefeito da cidade daria um tiro na própria cabeça, de vergonha.

Também graças a doações, jovens voluntários da Teto construirão 50 casas populares entre 23 e 28 de julho em comunidades pobres de Campinas. Isso mesmo: em seis dias. Por que o governo leva tanto tempo para entregar um lote habitacional, para consertar uma estrada, para reconstruir uma ciclovia, para terminar uma obra? Por que não há seriedade com questões como aproveitamento de recursos e cumprimento de prazo?

A política brasileira está caindo de podre e em breve, espero, haverá renovação, mas, além de novas lideranças, precisamos de uma nova mentalidade. O provincianismo do Brasil está em focar apenas em grandes feitos a fim de ostentá-los. Isso não é riqueza, e sim estupidez.

Num país rico e elegante pra valer, as pessoas (políticos inclusive) vão para o trabalho de metrô e bicicleta, as crianças estudam em ótimas escolas públicas, todos os membros da família se ocupam do serviço doméstico, as festas não custam o preço de um apartamento, as pessoas envelhecem sem abusar de cirurgias estéticas e arte é de primeira necessidade. Por que não somos esse país rico e elegante? Não é por falta de dinheiro – somos milionários. Dinheiro nunca faltou para roubos, desvios, superfaturamentos.

O problema é que trocamos eficiência por desperdício. Não sabemos focar no que importa de verdade. Valorizamos mais a fantasia (o discurso, a retórica, as aparências) do que a realidade. A gente se ilude com uma “ponte de R$ 270 mil” que nunca sairá do papel em vez de concretizar a humilde ponte de R$ 5 mil que resolve.

Estamos em crise, e uma crise forte, sem prazo pra acabar. É obrigatório cair na real e viabilizar um Brasil onde todos tenham uma casa que não desabe na primeira chuva, onde as escolas sejam lugares lúdicos e estimulantes, onde os caminhões que escoam a safra possam chegar ao destino sem quebrar por causa de um buraco no caminho, onde, em vez de molhar a mão de corruptos, as prefeituras mantenham dinheiro em caixa para pagar policiais, médicos, professores e demais profissionais que fazem uma nação existir como tal.

Todos nós, brasileiros, precisamos recuperar o foco imediatamente e extrair da simplicidade a nossa evolução.



Jornal Zero Hora - 22 junho 2016
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